Datação
absoluta
Os princípios de datação relativa, através do
uso dos fósseis, permitiram, ainda no século XIX, o estabelecimento da coluna
do tempo geológico. Esta foi primeiramente baseada em afloramentos de rochas
sedimentares da Europa, sendo posteriormente estendida para outros continentes.
Como já mencionado, os métodos de datação relativa possibilitam um correto
empilhamento das rochas no tempo e a correlação de distintos pacotes de rochas,
mas não fornecem dados para se saber a idade absoluta (em números) das rochas.
Foi só no início do século XX que uma nova metodologia
emergiu. Com a descoberta da radiatividade e de que alguns elementos químicos
presentes nas rocha emitiam radiação a taxas constantes, foi desenvolvido o
método de Datação Absoluta das Rochas. Para entendermos essa metodologia, vamos
ter que compreender alguns conceitos sobre isótopos radiativos.
Isótopos radiativos e meia-vida
Na natureza, existem alguns elementos que
apresentam isótopos, ou seja, elementos que apresentam o mesmo número
atômico(Z), mas diferentes números de massa (A).
Um exemplo é o oxigênio, que possui três
isótopos:
oxigênio 16 - 8 prótons e 8 neutrons (A = 16)
oxigênio 17 - 8 prótons e 9 neutrons (A = 17)
oxigênio 18 - 8 prótons e 10 neutrons (A = 18)
No caso do oxigênio, esses isótopos que existem
na natureza são estáveis. Há porém, outos elementos que são instáveis na
natureza e, devido a isso, têm a tendência a se transformarem em outro elemento
mais estável. Esses são os chamados isótopos radiativos. Nessa transformação,
denominada decaimento radiativo, radiação é emitida e calor é liberado. O
decaimento radiativo, é um processo lento que ocorre a uma taxa constante
chamada meia-vida.
Um dos mais conhecidos é o Carbono 14 (C14). O
C14 é um dos isótopos do Carbono. O outro é o Carbono 12 (C12), muito mais
abundante. O C12 apresenta 6 prótons e 6 neutros, enquanto o C14 apresenta 6
prótons e 8 neutrons. Como o C14 é instável, ele tem a tendência a se
transformar em Nitrogênio 14 (N14). A cada meia-vida, metade dos átomos
originais de C14 presentes em uma amostra vão se transformar em átomos de N14.
A meia vida do C14 é de 5.730 anos. Isso significa que a cada 5.730 anos metade
dos átomos do isótopo original (isótopo-pai) se transformará em átomos do
isótopo-filho.
Como o C14 pode ser usado na datação de
materiais orgânicos antigos, como, por exemplo, os ossos? A explicação é que os
vegetais, ao realizarem a fotossíntese, absorvem CO2. Este CO2 é composto tanto
de átomos de C12 (99%) quanto de C14. Os animais, que são consumidores na
cadeia alimentar, incorporam em seus tecidos parte do carbono presente nos
vegetais, na forma de glicose (C6H12O6), produzida através da fotossíntese.
Ossos são tecidos vivos que acumulam carbono, seja na forma de C12 quanto de
C14 e, portanto, a proporção de N14 em relação ao C14 em um osso antigo, nos
fornecerá o número de meias-vidas transcorridas e, por conseqência, a idade
daquele osso.
A datação por C14/N14 é utilizada em materiais
não muito antigos, por exemplo em múmias egípcias com alguns poucos milhares de
anos. Materias mais velhos que 70.000 anos não são passíveis de datação por
C14. Por quê? Para responder a esssa questão, vamos lançar mão de uma analogia.
Imagine uma festa de aniversário em que é
servida uma torta deliciosa. Todos os convidados recebem a sua fatia e resta
uma última fatia no prato da torta. Cada convidado, depois de saborear a sua
fatia, fica de olho na fatia que restou, mas ninguém tem coragem de pegar a
fatia inteira, pois não "pega bem". Assim, um dos convidados se enche
de coragem e corta metade da fatia, deixando a outra parte no prato. Um segundo
convidado, vai lá e corta metade da metade da última fatia. Um terceiro
convidado corta, então, a metade da metade da metade e assim por diante. Vai
chegar um momento em que não há mais sequer um farelo da torta original no
prato. Cada fatia 1, 2, 3, 4, 5 e 6 corresponde à metade da espessura da fatia
anterior.
Voltando aos isótopos, é exatamente isso que
ocorre durante o decaimento radiativo. A cada meia-vida, metade dos átomos originais
(isótopos-pais) decai, transformando-se em isótopos-filhos. A tabela abaixo
resume o que aconteceria com uma amostra contendo 1000 átomos de C14.
Meia-Vida = 5.700 anos
|
C14 (Isótopos-pais)
|
N14 (isótopos-filhos)
|
Tempo
zero
|
1000
|
0
|
1
meia-vida
|
500
|
500
|
2
meias-vidas
|
250
|
750
|
3
meias-vidas
|
125
|
875
|
4
meias-vidas
|
62,5
|
937,5
|
5
meias-vidas
|
31,25
|
968,75
|
6
meias-vidas
|
15,75
|
984,5
|
7
meias-vidas
|
7,875
|
992,375
|
E assim por diante...
Se representarmos o decaimento radiativo na
forma de um gráfico, vamos observar que a redução dos isótopos-pais é
diretamente proporcional ao aumento dos isótopos-filhos ao longo do tempo
transcorrido (meias-vidas).
Voltando à analogia da torta, fica mais claro agora,
entender porque o C14 não se presta para datação de amostras mais antigas que
70.000 anos. Segundo a tabela acima, em 7 meias-vidas somente 7,875 (0,007875%)
dos 1000 isótopos-pais permanecem na amostra.
Bom, se o C14, com sua meia-vida de 5.730 anos,
não possibilita datação de materiais muito antigos, existem isótopos que
permitem isso? A resposta é sim ... e não.
Há de fato isótopos radiativos com meias-vidas
muito superiores à do C14 (ver tabela abaixo).
Isópo-Pai
|
Isótopo-filho
|
Meia-Vida em anos
|
Urânio-238
|
Chumbo-206
|
4,5 bilhões
|
Urânio-235
|
Chumbo-206
|
704 milhões
|
Tório-232
|
Chumbo-208
|
14 bilhões
|
Rubídio-87
|
Estrôncio-87
|
48,8 bilhões
|
Potássio-40
|
Argônio-40
|
1,25 bilhões
|
O que acontece é que esses elementos não estão
presentes na composição química dos tecidos dos seres vivos e, portanto, não
vão estar presentes em um resto orgânico fossilizado. Assim, esta metodologia
não serve para datar fósseis. Mas vai ser aplicada na datação de rochas.
Datação absoluta de
rochas
A datação absoluta das rochas baseia-se na
premissa de que uma rocha é um "sistema fechado", cuja composição
química não sofre alterações por influência de fatores externos. Sendo assim,
qualquer alteração química que ocorrer na rocha, vai ser devida a decaimento
radiativo de isótopos instáveis presentes nessa rocha desde o momento de sua
cristalização. Isso é válido somente para rochas ígneas, a partir de sua
cristalização e para rochas metamórficas depois de sua recristalização. As
rochas sedimentares, formadas por partículas dos outros tipos de rocha (ígneas
e metamórficas) ou, ainda por partículas de outras rochas sedimentares e restos
esqueletais de organismos, não podem ser datadas pelos tradicionais métodos
baseados em isótopos radiativos. Isso se deve ao fato de que é impossível saber
quado determinado isótopo foi incorporado à rocha sedimentar.
A datação absoluta das rochas é feita por um
equipamento denominado Espectrômetro de Massa.
O uso dos fósseis como ferramentas para Datação Relativa
A partir dos princípios postulados por Steno e
Hutton, outros cientistas começaram a tentar entender como os fósseis contidos
nas rochas sedimentares poderiam ser usados para auxiliar na estratigrafia.
Dois novos princípios, utilizando fósseis como
ferramentas, se somaram aos princípios da estratigrafia. Esses princípios foram
concebidos por Georges Cuvier, um paleontólogo/anatomista de vertebrados
francês, e Willian Smith, um agrimensor inglês.
Cuvier, considerado o "Pai da Anatomia
Comparada", enquanto prospectava fósseis de vertebrados nos arredores de
Paris, começou a perceber que cada camada de rochas abrigava um conjunto de
fósseis diferente das outras camadas. Verificou, também, que os fósseis das
camadas mais inferiores apresentavam características mais primitivas do que os
fósseis das camadas mais superiores, os quais se assemelhavam mais aos animais
atuais. Segundo Cuvier, essa "Sucessão Faunística" era produto de
extinções catastróficas que aconteceram de tempos em tempos na história da
Terra. Assim, depois de cada evento de extinção, que dizimava a fauna inteira
de uma determinada área, novos organismos provenientes de outros lugares
ocupavam os ambientes vagos. Essa teoria de Cuvier é chamada de Catastrofismo.
Princípio da Sucessão
Faunística ou Sucessão Fóssil
Willian Smith, enquanto realizava seus
trabalhos de agrimensor em canais e minas nas propriedades rurais da
Inglaterra, percebeu que as mesmas sucessões de rochas sedimentares afloravam
em distintas regiões e que cada camada de rocha continha determinados fósseis
que não eram encontrados nas outras camadas. Assim, ele postulou que as camadas
de rochas encontradas em áreas geograficamente distantes podiam ser
correlacionadas pelo seu conteúdo fossilífero.
Princípio da
Correlação Fóssil
As correlações temporais (correlações
estratigráficas) entre camadas de rocha situadas a longa distância são
realizadas com a utilização de fósseis (gêneros, espécies) que reúnem uma série
de características especiais. Estes são chamados de fósseis-guia ou fósseis-índice.
Além da grande distribuição geográfica (cosmopolitas), esses fósseis devem
apresentar curta amplitude vertical (ter surgido e se extinguido rapidamente),
devem ser facilmente identificáveis e devem ser abundantes. Os melhores
fósseis-guia são organismos marinhos, de preferência, de hábito plantônico.
Assim, com o auxílio dos fósseis, estavam
criadas as bases para um correto empilhamento das camadas de rochas e sua
correlação temporal. Esse método é conhecido como Datação Relativa.